Achou que era tempo propício para aspirações!
Como quem diz: "e assim seja", pegou uma caneta e um papel, sentou-se e resolveu registrar tudo... Algum tempo depois, menos entusiasmo, mais ansiedade, papel ainda em branco. Mais tempo, papel amassado no chão, semblante preocupado, pernas inquietas. Pouco depois, outra folha de papel, olhar determinado e confiante. Hora depois, medo, feição triste e olhos mareados. Resolveu deixar para o dia seguinte, mas comprometeu-se a não desistir.
Deitou-se, mas não conseguia dormir; somente pensava nas aspirações. Não entendia como conseguia pensar tanto em algo que não sabia o que era. Se pensava nelas, era porque existiam, e se existiam porque não conseguia escrevê-las? Não fazia o menor sentido, ao menos era o que parecia.
Começou a pensar no que tinha, no que era real, no que gostaria de manter. Com as mãos atrás da cabeça, olhava para o teto como se nele estivesse projetado um bom filme, o melhor de todos! Pensava, pensava, pensava e um riso discreto, mas satisfeito podia ser visto em seu rosto. Sentiu-se bem, sentiu-se uma pessoa privilegiada e abençoada!
Resolveu usar daquele "filme" para encontrar suas aspirações, afinal de contas, seria natural aspirar ao que era semelhante ou complementar ao que já era real e bom... Algum tempo depois viu que se enganara mais uma vez. Cochilou, olhou o relógio, ainda madrugada. Tentou voltar a dormir, mas não dava! Por que tinha inventado aquela 'bobagem'?
Com um certo arrependimento, pensou em outra estratégia, já que dormir não ia mesmo... Começou a pensar no que não tinha, no que não era real e no que não gostaria de manter. Assistiu outro "bom filme" em cartaz naquele teto. No final concluiu, em choque, que ainda não conseguia definir muita coisa e ainda não estava com sono.
Acabou vendo como aquilo que não tinha e que era totalmente diferente da sua realidade parecia extremamente interessante! Achou estranho, porque sabia que amava o que tinha. Além disso, aspirando àquilo que era totalmente diferente, não somente optava por algo que não era complementar, como também colocava em risco o que já tinha. Que loucura!
Como é que abrir mão do que era bom e real poderia parecer atrativo? Não era dessas pessoas imprudentes e ingratas que consideram realidades e relações como coisas descartáveis, pelo menos assim achava. Supondo então que aspirasse ao novo, ao que não era complementar à sua realidade, que ao contrário, modificava tudo; começou outro filme...
Mas esse durou pouco, pouquíssimo, porque não tinha ideia do que imaginar; tudo parecia incerto. Digamos que viu somente a sinopse, e essa despertou-lhe curiosidade. Meio desconfortável, imaginou mais uma vez como aquilo afetava tudo que conhecia, tudo que amava... Concluiu que aspirações podiam ser perigosas! Pensou de novo como eram confusas as coisas a que aspirava, como eram diferentes e, às vezes, até opostas umas às outras...
Já sabia o que fazer! Levantou-se, pegou o papel em branco e escreveu aquilo que já tinha decidido há tempo: "não desistir". Isso sim era grande aspiração! Indicava apenas um passo nesse caminho, que considerando ambos "filmes", certamente não seria movido pela inércia; mas por escolhas, construções e desconstruções, mais passos, saltos, desvios, corridas...
Olhou para o papel e sorriu! Olhou mais uma vez, e o olhar se perdeu na imensidão daquilo que se desenhava; os olhos brilharam com as possibilidades e também com as lágrimas que queriam sair. Mas por enquanto, já havia descoberto uma importante aspiração. Colocou o papel na mesa, voltou para a cama e dormiu rápido dessa vez.
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